sábado, 29 de maio de 2010

Com erros e acertos se faz a vida


Assistindo o programa de entrevista de Roberto D'Ávila com a professora Cleonice Beradinelli, especialista em Luis de Camões e Fernando Pessoa, vejo-o perguntar-lhe: "Como a Sra. define o caráter português".
Lendo o livro 1808, de Laurentino Gomes, aprofundamos o entendimento do que acontecia em Portugal no século 18. "Dos 300 navios lusitanos que atracavam por ano no porto de Lisboa, um terço estava diretamente dedicado ao comércio com o Brasil". Sendo o Brasil sua principal fonte de renda, em 1736, um experiente assessor do rei sugeriu ao regente a mudança da corte para cá onde se formaria o Império do Ocidente. Outro, já no início do século 19, com Napoleão ameaçando levar o rei preso para Paris, lembrou: "Vossa Alteza Real tem um grande império no Brasil". Então é inexplicável que alguns anos depois, em 1822, Portugal tenha aceitado no grito a independência desta terra enorme e tão rica. Perder este quase continente e ficar com aquela "orelha de terra", nas palavras do primeiro assessor citado, não dá para se entender. A menos que se compreenda o jeito de ser dos portugueses e nosso também, herdeiros que somos deles.
Primeiro, Portugal não tinha infra-instrutora. Com vinte e poucos navios de guerra - "uma frota insignificante" - para cuidar de colônias na Ásia, na África e na América não tinha condições de cuidar do que era seu. Não se parece com o Brasil, este gigante adormecido?
O livro 1808 aponta outra coisa séria: "Só em Lisboa, cidade com 200 mil habitantes, havia 180 igrejas e monastérios... A vida pautava-se pelas missas, procissões e outras cerimônias religiosas". Esta maneira de encarar a vida - que o negro baiano Gilberto Gil cantou tão desafiadoramente na música que repete o tempo todo: "Deus dará, Deus dará" e contesta: "E se Deus não dar, como é que vai ficar, ô nega?" - deu no que deu: "Nos últimos dois séculos não produziu a Península um único homem superior, que se possa colocar ao lado dos grandes criadores da ciência moderna".
A falta de investimento em educação - não, lembrando o que disse um secretário de obras da prefeitura de Volta Redonda, a propósito de uma reunião sobre implantação de ciclovias: "Vamos fazer alguma coisa e esperar que a população use e exija mais" - ou o desinteresse do povo em reconhecer o valor dos anos de estudo, levou a uma estagnação pública. Diz o livro: "Quando há abundância de riquezas naturais a tendência é solapar o desenvolvimento sustentado.
Então, cuidado. Lembra a piada engraçada do português? Pois é, se bobearmos vamos achar muito sem graça a piada que fizerem com a gente, a piada do brasileiro.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Rindo das coisas sérias


A Bíblia afirma que "não há nada de novo debaixo do céu". Assim, não é de se estranhar que o humor dos programas humorístico de TV tipo CQC, Pânico na TV e Casseta e Planeta, eram comuns na Europa ao tempo da descoberta do Brasil. Assim nos conta Mijail Bajtín (1895-1975), filósofo russo, em La cultura popular en la Edad Media y en el Renacimiento:
"La risa acompañaba también las ceremonias y los ritos civiles de la vida cotidiana. Así, los bufones y los payasos asistían siempre a lãs funciones del ceremonial serio, parodiando sus actos (proclamación de los nombres de los vencedores de los torneos, ceremonias de entrega del derecho de vasallaje, sagracion de los nuevos caballeros armados, etc.). Ninguna fiesta se desarrollaba sin la intervención de los elementos de una organización cómica; así, para el desarrollo de una fiesta, acontecia la elección de reinas y reyes de la risa. Estas formas rituales y de espectáculo organizadas a la manera cômica y consagradas por la tradición, se habían difundido en todos los países europeo".
Houve épocas em que a seriedade dos costumes predominavam imposta por governos que fingiam ser irrepreensíveis, na realidade eram hipócritas e farisaicos (faça o que eu digo, mas não faça o que eu pratico por debaixo dos panos). Os tribunais da Inquisição tiraram muito da alegria da Europa numa época em que pragas repetidas tiravam vidas e o pouco da sanidade do povo. Na Inglaterra e na América do Norte do século 18 - lá com a era Vitoriana e na outra com os peregrinos protestantes - o povo sofreu ainda mais do que a vida dura já os castigava. No Brasil a seriedade sempre foi vencida pela irreverência e o riso correu solto. Os jesuítas bem que tentaram segurar e patrulhar a vida livre dos europeus que saíram da repressão de suas terras, ou a inocência sensual dos índios, mas o brasileiro nasceu zombando da caturrice da vida. A escravidão quis domar a alegria africana para aqui trazida, mas foi em vão, pois os negros de tudo faziam festa: os restos do porco viravam uma festiva feijoada, as circunspectas festas santas com suas procissões sisudas viravam batuque nos terreiros - São Sebastião, flechado e sofrido, virava Óxossi enfeitado de penas que dançava feliz sob o som dos atabaques.
Não gosto das brincadeiras insistentes dos provocadores da TV, mas dou-lhes razão de tentar tirar a máscara de falsa seriedade de políticos e artistas. Nestes quadros quanto mais o assediado tenta escapar da brincadeira mais sofre. Deviam fazer como o cidadão nos tempos da viagens marítimas e no meio do carnaval não ser só um assistente, mas participar das brincadeiras: "Los espectadores no asisten al carnaval, sino que lo viven, ya que el carnaval está hecho para todo el pueblo".
Sempre foi assim.
"Esto nos permite afirmar, sin exageración, que la profunda originalidad de la antigua cultura cómica popular, su amplitud e importancia, eran considerables en la Edad Media y en el Renacimiento. El mundo infinito de las formas y manifestaciones de la risa se oponía a la cultura oficial, al tono serio, religioso y feudal de la época. Dentro de su diversidad, estas formas y manifestaciones – las fiestas públicas carnavalescas, los ritos y cultos cómicos, los bufones y bobos, gigantes, enanos y monstruos, payasos de diversos estilos y categorías y la literatura paródica, vasta y multiforme, poseen una unidad de estilo y constituyen únicas e indivisibles de la cultura cómica popular".
Como diz a mesma Bíblia: "É bom que o homem se alegre".

Fuja da loucura


O estudo de "vida literária", a literatura estudada em termos de vida social, desvenda como o sentimento das pessoas sempre moldou a forma que a arte toma.
No século 16, quando o Brasil foi descoberto, a Europa se afligia com tantas guerras entre os senhores feudais, a religião impunha tantas regras e o povo se amargurava com uma sucessão tão terrível de pragas, que os indivíduos buscavam nas festas e no carnaval, nas exibições dos palhaços e nas lendas contadas pelos menestréis com muito humor e jocosidade um refrigério para a alma. Isto resultou numa literatura burlesca, em livros como: Pantagruel, de François Rabelais; Decameron, de Giovanni Boccaccio e as poesias de Shakespeare.
Então, no final do século 18, o mundo já ordenado em reinos, o povo está insatisfeito e as revoluções espocam na colônia americana da Inglaterra e na França. Seus ideais se espalham pelo mundo e a arte se torna romântica. Os cidadãos já não querem pensar na vida da maneira burguesa – em que o dinheiro é o mais importante - não, a vida também é sonho, fantasia e amor. E isto visto sob uma nova ótica religiosa, não a religião repressora, mas a que provê reconciliação e perdão. Surgem livros como Madame Bovary, de Gustave Flaubert; O Vermelho e o Negro, de Marie Henri Beyle (Stendhal); Comédia Humana, de Honoré de Balzac. É o romantismo "que dá ao comum um sentido elevado, ao costumeiro um aspecto misterioso, ao conhecido a dignidade do desconhecido, ao finito um brilho de infinitude”, como definiu o poeta alemão Georg Philipp Friedrich von Hardenberg (Novalis)".
Agora vivemos na época moderna e o coração das criaturas de nosso tempo está, como descreve o sociólogo Max Weber, "cheio de desencantamento do mundo". Daí, a arte de nosso século não ter inocência, e o homem e a mulher atual gostar de uma música louca, uma pintura caótica, programas de TV e filmes cheios de violência e uma literatura de informação.
Por isto as almas sensíveis tentam não submergir nessa loucura e fogem desta arte buscando no passado o que foi bom, e enchendo os olhos das imagens, os ouvidos dos sons, enfim, mergulhando a mente e o coração na natureza.
Não sei dizer se isto é imitar a avestruz que, dizem, se esconde enfiando a cabeça em um buraco.

sábado, 22 de maio de 2010

A Cristandade e o Cristianismo


A novela A Cruzada do Ouro conta:
“Mesmo antes das invasões bárbaras, a Igreja tinha começado a se apropriar de templos em Roma e a despojá-los de seus artefatos, logo depois da conversão de Constantino ao cristianismo no século IV d.C".
Ora, não se pode esquecer que o cristianismo nasceu do judaísmo e que cresceu em meio aos cultos pagãos do império romano. Impossível não ter incluído festas, e crenças. Então, quando Constantino mudou a capital para Bizâncio, na Ázia, os ensinamentos do profeta judeu Jesus (que para mim foi mais que um pregador iluminado, é um ser espiritual muito alto - tão próximo de Deus que eram um só - que encarnou como homem) foi se mesclando cada vez mais com outras formas de religião. Muitos entendem que isto desfigurou o cristianismo, mas penso que acrescentou, incorporou mais conceitos.
Um caso importante é comentado na mesma novela: "A partir do século VIII d.C., os comerciantes escandinavos começaram a penetrar nos rios da Europa central e oriental, do Vístula no Báltico até o Dnieper no mar Negro. Eles buscavam riquezas incalculáveis, os fabulosos tesouros do Oriente, uma procura por prata e pedras preciosas que os levou para a Ásia Central e bem profundamente para dentro do mundo do Islã. Finalmente eles fundaram o reino viking de Rus, a origem da Rússia moderna. De sua fortaleza em Kiev, eles estavam muito perto do lugar chamado Michelgard, a Grande Cidade, uma jornada perigosa pelo Dnieper, mas a chave para riquezas jamais sonhadas estava lá, em Constantinopla."
Os vikings percorreram mais de 3.000 km e viveram com seu modo espalhafatoso bem no meio dos cristãos que, ali, já estavam impregnados das tradições e da mitologia dos cultos gregos. À Jesus, Maria, José, os apóstolos e santos juntavam-se sincreticamente Zeus, Apolo, Atena e, agora, Thor e seu machado de guerra.
As religiões são uma mescla de antigas adorações.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

O ser humano tão pequeno


O ser humano tão pequeno, mas usando sua inteligência, descobriu a sua volta ferramentas maravilhosas que o criador por meio de seus agentes, inclusive a natureza, nos forneceu para aumentar nossas capacidades. Não tínhamos força para mover uma pedra muito pesada, descobrimos a lei da alavanca. É o mesmo princípio aplicado as nossas bicicletas que com suas 27 marchas aumentam a força de nossas pernas e nos permitem subir serras com mais de 1.500 m de altitude.
O mesmo aconteceu com nossa visão. Os homens e mulheres que, desde a Babilônia, passavam as noites acordados estudando os astros celestes tinham capacidade limitada para ver, então veio em seu auxílio os vidros curvos (lentes) que ampliavam os objetos e permitia estudá-los melhor e ver muito mais longe. Mas isto foi só o começo. A astrofísica Patrizia Caraveo diz:
"Para entender como e do que é feito o Universo, os astrônomos devem fazer cuidadosos recenseamentos dos objetos celestes procurando medir a sua distância e atribuir-lhes uma massa. Nessa tarefa são ajudados pela maravilhosa simplicidade das leis da física".
Hoje, "o estudo do cosmo é feito por meio da óptica, radioastronomia, raios X e gama".
Mas tem um problema que a Dra. explica: "Há décadas sabemos que a matéria luminosa - aquela que 'vemos' porque emite radiação eletromagnética, ou seja, luz, ondas de rádio, raios X e gama - é apenas uma parcela insignificante (0,05) de toda a matéria que exerce uma função gravitacional. Este é o famoso problema da 'matéria escura', um dos desafios mais estimulantes da astrofísica atual".
'Matéria escura' foi o nome dado pelos astrônomos a uma substância que soma mais de 99% do que existe no universo, mas por ser completamente diferente dos átomos que conhecemos ainda não temos ferramentas para estudá-la.
- E este conhecimento serve pralguma coisa?
- Sei lá! Mas se existe é bom a gente saber, né não?

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Dialética e lógica não são sinônimos


e a compreensão delas edifica os homens. Platão, conforme conta Sócrates em Sofismas, definiu a primeira como sendo um debate de idéias e a segunda como a ciência que estuda as leis do raciocínio. Aristóteles em sua obra Retórica usa o termo "lógica" para os dois casos: lógica para convencer e lógica para estabelecer a verdade.
Por que isto tudo é importante? Quando duas ou mais pessoas se encontram, cada qual com sua história, para que haja uma afinidade de idéias é sábio se usar os princípios da lógica - raciocinando com os que pensam diferente - e da dialética - diálogando para que se faça um encontro entre o que a outra parte acredita e o que entendemos como verdade.
"La Lógica, ciencia del razonamiento, del procedimiento de la pura razón, podría entonces ser construida genuinamente a priori [suas leis aplicando-se a todos os casos]. Y la Dialéctica, mayormente sólo en forma a posteriori [cada caso precisando de argumentos próprios], del conocimiento derivado de los medios que dos individuos utilizan entre sí para hacer valer su forma de pensar individual", disse Shopenhauer.
Os problemas em uma conversa de aprendizado começam quando ambos acreditam saber a verdade.
"Cuando A descubre que los pensamientos de B sobre el mismo tema distan de sus propios, A no revea su propio razonamiento para encontrar el error: esto significa que el hombre es, por naturaleza, ergotista".
Nesta situação ainda há esperança dos dois aprenderem? Há, se pelo menos um pensar antes de responder, porque se "el argumento era inválido; pero existía otro argumento, este sí, válido para nuestra afirmación: el argumento redentor sólo no nos ocurrió de inmediato".
Então, a dialética exige de quem quer ensinar uma mente vivaz, que consiga pensar nos diversos argumentos, e tranquilidade para ter tempo de pensar. Então, o que sei posso doar àquele que também sabe alguma coisa, mas não o que aprendi estudando. Mas, se aquele não quiser aprender mais nada, então é melhor procurar outro alguém com quem valha a pena usar a dialética e a lógica.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Falemos do inominável!


"Mudam os dogmas e é falaz o nosso saber, mas a natureza não se engana jamais: o seu passo é seguro e ela não o esconde. Tudo nela é completo e ela efetivamente é completa em tudo. A natureza tem o seu centro em cada ser animado: o animal encontrou com segurança o caminho para entrar na existência, como com segurança o encontrará para sair dela: nesse entretempo vive sem temor da morte e sem cuidados na consciência de ser a própria natureza e como ela imperecível".
Palavras de Schopenhauer, palavras da razão. Mas nós, os humanos, realização máxima da natureza não nos conformamos com a morte. É natural nosso antropocentrismo, cada qual se sente o centro da natureza. E tem uma razão, não nos deixar pensar no inominável.
"O homem, somente o homem, leva consigo a convicção abstrata da própria morte. Mas, coisa estranha!, tal convicção não o inquieta senão a intervalos, quando alguma circunstância lhe evoca à mente. No homem, portanto, como no animal que não pensa, reina permanentemente esta segurança, oriunda da consciência profunda de ser ele próprio a natureza e o mundo; o que impede que o sentimento duma morte inevitável e sempre iminente o torture de modo demasiado vivaz, enquanto lhe permite levar avante tranquilamente a vida, como se esta nunca tivesse que cessar; isto chega até mesmo a tal ponto, que se poderia afirmar que nenhum homem possui a convicção real e viva de que tem de morrer; sem o que não poderia subsistir uma diferença tão grande entre o seu estado habitual de espírito e o dum condenado à morte".
Um princípio dentre de cada um, como um giroscópio, nos mantêm na rota: este sou eu, este momento, este em que vivo.
"Cada um possui, a bem dizer, a certeza da morte in-abstrato e em teoria, mas cada um a põe de parte, como se costuma fazer com muitas verdades teóricas que não encontram aplicação prática, e não lhe dá nunca acesso na sua consciência vivente".
Este sou eu.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

A Alegria dos Excepcionais


Há um lugar que gosto de ir e que Malu se diverte muito, a APAE de Volta Redonda. Aproveito e levo o carro cheio de recicláveis que a associação vende e faz dinheiro. Em um quintal amplo, onde além das construções tem uma horta grande e uma área com mata, Malu corre, procura bichos e sente cheiros estranhos. Mas o melhor é o bom astral do lugar. As crianças com síndrome de Dowm ou com retardo cerebral são alegres e se aproximam dela temerosos, mas felizes, e ela deixa que passem as mãos em seu cabelo encaracolado e macio.
Em todos os tempos estas pessoas excepcionais, ao invés de ser triste eram inocentemente alegres e faziam os outros rir. Na idade Média eram escolhidos para divertir, tanto os nobres nos salões quanto o povo em praça pública. Mijail Bajtín (1895-1975), filósofo russo, conta em La cultura popular en la Edad Media y en el Renacimiento:
"Lo mismo ocurría con las fiestas agrícolas, como la vendimia, que se celebraban en las ciudades. La risa acompañaba también las ceremonias y los ritos civiles de la vida cotidiana: así, los bufones y los tontos, gigantes, enanos y lisiados, y payasos de diversos estilos y categorías, asistían siempre a las funciones del ceremonial serio, parodiando sus actos (proclamación de los nombres de los vencedores de los torneos, ceremonias de entrega del derecho de vasallaje, de los nuevos caballeros armados, etc.). Ninguna fiesta se desarrollaba sin la intervención de los elementos de una organización cómica; así, para el desarrollo de una fiesta, tenia la elección de reinas y reyes de la risa. Estas formas rituales y de espectáculo organizadas a la manera comica y consagradas por la tradición, se había difundido en todos os países latinos, especialmente en Francia, y presentaban una diferencia notable, una diferencia de principio, podríamos decir, con las formas del culto y las ceremonias oficiales serias de la Iglesia o del Estado feudal. Ofrecían una visión del mundo, del hombre y de las relaciones humanas totalmente diferente, deliberadamente no oficial, exterior a la Iglesia y al Estado; parecían haber construido, al lado del mundo oficial, un segundo mundo y una segunda vida a la que los hombres de la Edad Media pertenecían".
Os homens e mulheres que não eram "normais", mas eram cheios de alegria inocente, contribuíam para melhorar o mundo. Não é um paradoxo, aqueles que nós supomos sofredores, têm no coração uma paz e alegria [uma doação divina?] que nos falta? À nós, que choramos de barriga cheia.
"Los bufones, gigantes, ananos, alisiados y payasos son los personajes característicos de la cultura cómica de la Edad Media. Como tales, encarnaban una forma especial de la vida, a la vez real e ideal. Se situaban en la frontera entre la vida y el arte (en una esfera intermedia), ni personajes excéntricos o estúpidos ni actores cómicos. En cierto modo, los vehículos permanentes y consagrados del principio carnavalesco en la vida cotidiana".
Por isto eu e Malu aguardamos ansiosos o dia de levar reciclados à APAE.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

O Caminho Estreito


Quando era um homem jovem me impressionava uma propaganda de cigarro que depois de nos deixar ver um homem e sua bela mansão, sua linda mulher e sua picap incrementada o mostrava fumando e dizia em off: o homem que sabe o que quer. Não eram as coisas que ele possuia e muito menos o seu cigarro de cheiro artificial (que eu só imaginava), mas sua determinação, sua vida em linha reta, sem zigzagues, como a minha.
Schopenhauer diz algumas coisas reveladoras sobre isto.
"Porque, tal como o nosso caminho material sobre a terra não é uma superficie mas uma linha, assim também na vida, quando queremos apoderar-nos de alguma coisa e conservá-la, é preciso que nos resignemos a abandonar uma imensidade de outras. Não saber resolver-se, estender, como as crianças nas feiras, a mão para tudo o que na passagem nos tenta, é uma conduta absurda, é querer mudar em superfície a linha da nossa vida: corremos então em ziguezague, como fogos-fátuos erramos por aquém e acabamos com chegar a nada".
Pessoalmente não gosto das comparações negativas com crianças, suas atitudes, mesmo a de querer provar de tudo na grande feira da vida tem sua razão de ser. Parecendo ter me ouvido ele continua:
"Tentemos outra comparação: segundo a teoria do direito em Hobbes, cada homem em origem possui um direito sobre todas as coisas, mas este direito não é exclusivo; para que se torne tal sobre certas coisas, é preciso que o homem renuncie ao resto e em compensação os outros farão o mesmo em relação ao que foi escolhido por ele".
É isto, não podemos ter tudo o que queremos, mas podemos ser felizes com o que a sorte e nossa vontade nos permitiu alcançar. Então, o filósofo nos aconselha, feito o padre numa homilia:
"Invejar pessoas por posições e condições que convêm ao caráter delas e não ao seu e que o fariam porventura infeliz, lhe tornariam insuportável a existência".

domingo, 9 de maio de 2010

Por que não enriquei?


Em um texto do jovem escritor Chico Mattoso li no papel o que desconfio no mais íntimo de meus sentimentos.
“Ao longo dos últimos anos, e certamente contra sua vontade, Rubinho Barrichello construiu um símbolo tão poderoso que ultrapassou os limites do esporte e virou uma espécie de representante arquétipo do fracasso. Existe algo de místico na figura do azarado. É como se ele tivesse sido ungido por uma força superior que lhe concedeu a capacidade mágica de estar sempre a um passo glória e acabar ficando invariavelmente no meio do caminho. Os grandes heróis brasileiros sempre nos pareceram como se não fizessem parte de nossa turma. É como se Ayrton Senna e Paulo Coelho, Pelé ou Gisele Bündchen fossem areia demais para nosso caminhãozinho”.
Os livros de auto-ajuda insistem que todo mundo pode ser um vencedor, um campeão, enfim, enricar. Mas lembro que na Bíblia tem uma reflexão que, não creio seja pessimista, entendo mais como realista (Eclesiastes cap 4 vers 4: “Descobri porque as pessoas se esforçam tanto para ter sucesso: é porque elas querem ser mais do que os outros. Mas tudo é ilusão, é como correr atrás do vento”.
Como para acrescentar uma opinião sobre a boa e má sorte li um artigo de José Sátiro Santiago: “Ao analisarmos as missões apresentadas por inúmeras empresas, é muito comum lermos que seus colaboradores são seus maiores patrimônios. No entanto, nestas empresas as pessoas são tratadas como simples peças que fazem parte de uma grande engrenagem que é a organização. Então, quando a empresa precisa diminuir seus custos, considera a redução de seu quadro de funcionários como a sua primeira ação. Acho que a declaração de que consideram seus colaboradores seus maiores bens, significa um enorme e equivocado abismo”.
E assim vai, uns ficam outros vão, uns nascem para ser Barrichello outros para Senna. E já vi que nesta vida não vim para enricar. No máximo vim para me distrair muito e chupar muita tangerina.

sábado, 1 de maio de 2010

Lendo o que faz bem


Nélida Piñon, escritora de 20 livros e a primeira mulher a ser presidente da Academia Brasileira de Letras, numa entrevista a Isto É de 24/02/2010, falou da falta de conteúdo e técnica dos escritores de agora: “São livros insignificantes, medíocres, que não o comprometem com o seu destino”.
Ela diz que os autores antigos tinham o que nos dizer: “Para se entender quem somos, deve-se ler Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, e William Shakespeare estabeleceu pautas morais, até metafísicas. Lendo-se o romance Guerra e Paz, do escritor russo Leon Tolstoi se compreenderá tudo o que Napoleão Bonaparte não soube entender”.
Um bom livro é uma viagem, mas mais do que isto. Numa época em que a ansiedade nos aflige tanto e a meditação fica tão difícil de alcançar, ler um livro acalma nossa mente, nos desliga das aflições e temores, e nos dá satisfação. A geração mais jovem, que vai viver num mundo de desenfreadas preocupações, não está sendo preparada para encontrar consolo em um bom livro.
“As pessoas não entendem o que lêem. A leitura induz a processar conceitos. Se ao ler não se entende o que o escritor está dizendo e não se exerce a crítica diante do que lhe está sendo dado, não apreende e passa a ser apenas um escravo da informação”.
Lembra quando começou a dirigir? Como era difícil lidar com os pedais, a direção e ainda manter os olhos e a atenção no trânsito. Quem não sabe ler é assim. Um bom leitor é como um surfista tarimbado voando na crista de uma onda ou em seus túneis, deslisa sobre as palavras percebendo o enredo, o fundo ético, comparando com sua própria história e descobrindo verdades que ainda não vira. O leitor que não conhece as palavras e se arrasta no texto não conseguirá fazer do livro um companheiro para as horas solitárias, tristes ou dolorosas.