domingo, 13 de dezembro de 2009

"Não são mais dois, mas um só", para com isso!


Muito se tem lido sobre o casamento e os problemas da vida conjugal. Quero lhe passar impressionantes considerações de Jung sobre o tema. Deixo-o com ele.
"Usualmente no casamento, especialmente quando as pessoas se casam jovens, uma relação individual é impossível, os dois se tornam muito parecidos. Mas para um par idêntico, nenhum relacionamento é possível, a convivência só funciona bem quando há diferenças. Assim, desde que a participation mystique ('e os dois se tornam uma só pessoa') é a condição tradicional de um casamento o casal termina insatisfeito; o mana de um assimila o mana do outro. Esta identidade comum, este estado de união, é um grande obstáculo ao relacionamento prazeroso. Talvez os dois escondam seus segredos um do outro ou talvez não tenham segredos para partilhar; então não há nada para protegê-los da participação mística, afunda-se ao buraco mais fundo da identidade e depois de um tempo se percebe que algo está errado. A relação sexual com sua esposa não funciona: ela o mantém tão distante quanto possível, e aos quarenta e sete anos ter sempre o mesmo trabalho de ir para cima de uma mulher ou de um homem que nos é bem conhecido é algo terrivelmente desinteressante. Portanto é uma situação desprazeirosa. Então, tanto o homem quanto a mulher buscam a sublimação. Sua tentativa tanto com uma devoção religiosa quanto com os estudos ocultos é parecida com a idéia de sublimação de Freud - um intercurso com os anjos. A Teosofia ou a religião levada a sério provê um escape. Se eu pudesse ouvir as vibrações da Atlântida, escutar a conversa dos mestres pedreiros no antigo Egito ou conversar com os santos e os espíritos eu esqueceria tudo sobre minha esposa e tudo sobre meus prezados pacientes também! A Teosofia é um tremendo chamariz para tal homem (como a religião para a mulher), e sublimação é uma boa palavra para descrever tal coisa; mas insuficiente, na realidade a sexualidade não pode ser inteiramente sublimada. Repentinamente, um dia, ele ou ela comete um erro, a sublimação não funcionou naquele momento. Então vem o sonho. A sombra aparece e diz: ‘Agora venha, vamos olhar os verdadeiros quadros do inconsciente, as figuras reais, imparciais, das coisas como são’".
Há muitos anos eu e Lili vivemos puxando um para cada lado, para sentirmos a felicidade da individualidade. "Chegamos sós neste mundo e partimos sozinhos", é uma máxima bem antiga.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Ainda não é o fim


Os argumentos humanos mudam sempre ao sabor do momento histórico. Veja a explanação de santo Agostinho no livro Cidade de Deus que começou a escrever dois anos depois da invasão de Roma pelos visigodos: " La Ciudad de Dios, está destinada a probar que las invasiones bárbaras no han sido una calamidad excepcional; que las guerras y matanzas son de todos los tiempos, y que los romanos contemporáneos no tienen por qué sorprenderse de ellas si se sienten más débiles que los bárbaros".
Percebeu? Não? Uma das razões para escrever seu livro de 700 páginas foi a de exortar aos cristãos católicos, que perderam quase tudo no saque perpetrado pelos bárbaros, que aquilo não era sinal de um próximo fim do mundo nem de que foi um castigo divino o sofrimento que afligiu tanto ao adorador politeísta quanto ao que acreditava ser Jesus, um judeu da longínqua Galiléia, o filho do único Deus enviado a Terra. "Basta ya de pecar y murmurar. ¡Qué vergüenza que anden los cristianos lamentándose de que Roma ha ardido en época cristiana. Roma ha ardido ya tres, veces: bajo los galos, bajo Nero y ahora con Alarico. ¿Qué sacamos de irritarnos? ¿Para qué rechinar de dientes contra Dios?”
Que diferença dos pregadores que querem subjugar as pessoas pelo medo do fim do mundo! Esquecem a História. Não querem ver que desde o princípio, quando a poeira estelar se ajuntou para formar o planeta, por diversas vezes cataclismos quase eliminaram a vida na Terra, mas ela sobreviveu. Assim são as palavras, mutáveis e poderosas.
PS. A pintura renascentista erra ao mostrar um livro no colo de santo Agostinho, no seu tempo ainda não havia sido inventado esta forma de publicar as palavras, usava-se códice, as páginas enroladas.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Falando com um deprimido


O psiquiatra Augusto Cury falando sobre depressão ensina que ao falar com alguém nesta situação não se deve ser condescendente ou trata-lo como um “pobrezinho” e aconselha a falar assim: “Quem disse que você é uma pessoa frágil que esgotou o prazer de viver? Ou um pobre que não consegue carregar o peso das suas perdas? Para mim você não é nada disso. Para mim, você é apenas um homem orgulhoso, alienado de misérias maiores que a sua”.
Cury diz que sua experiência com este modo de tratar o deprimido teve, entre outras, a seguinte resposta: “Um triste homem disse que na hora que falei isto pensou no pai que lhe esmagara a infância e lhe causara muita dor. Viu-o como uma pessoa emocionalmente distante, alienado e enclausurado em si mesmo. Ao ver que tinha tocado numa ferida profunda diminuí o tom de voz: ‘Eu respeito a sua dor. Ela é única e só você consegue senti-la. Ela te pertence e a mais ninguém’. Ele ficou quieto por um tempo e falou que sempre condenara veementemente seu pai, mas que começou a vê-lo, pela primeira vez, com outros olhos. Então lhe disse: ‘Para mim, você também é um ser humano corajoso, pois tenciona afastar-se do mundo e de tudo o que ele oferece e deixar sua família, trabalho e sonhos. É sem dúvida uma bela ilusão’”.
Mas a batalha contra a depressão não é ganha tão facilmente. O homem reagiu. “Já escolhi este destino. Não tenho mais esperança”. Ao que o doutor revidou: “Você já se sentenciou a viver num limbo? E nem se deu o direito de defesa? Porque não se dá o direito de argumentar com seus fantasmas, encarar suas perdas e lutar contra suas idéias pessimistas? Você é realmente injusto consigo mesmo!”
Então, o homem lembrou que já havia procurado a ajuda de outros psiquiatras e psicólogos, mas nada tocava seu rígido intelecto, nenhuma explicação conseguiu retirá-lo do seu atoleiro emocional. O médico então desferiu uma saraivada de perguntas: “Somos apenas um cérebro organizado ou temos uma psique que coexiste com o cérebro e transcende seus limites? Que religioso pode viver sem fé? Que neurocientista pode argumentar que lhe é bastante a especulação científica? Que ateu pode defender suas idéias contra Deus sem nem um pouco de insegurança? Sabe, somos dois ignorantes, a diferença entre nós é que eu reconheço a minha”.
São tantas as pessoas com depressão hoje em dia, que bem podíamos usar esta abordagem com alguém assim que apareça em nosso caminho. Mas com bastante empatia.