sábado, 21 de abril de 2007


ALAIN TOURAINE 1925- Sociólogo francês que leciona na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de Paris é outro pensador obcecado com a influência do Islamismo no mundo do século 21. Lembra do que o papa Bento XVI falou em uma conferência sobre o pensamento do Islã? Para não dizer o que pensa ele contou uma discussão entre um antecessor e o imperador de Bizâncio: “A religião de Maomé prega a intolerância com outras crenças e o confronto violento para resolver qualquer questão com os outros povos”. Foi uma barulheira tremenda no mundo todo. Mas o professor Alain se pergunta a mesma coisa: “O mudo islâmico, dentro do seu conjunto, e em suas várias partes, responde à modernidade, reconhecendo os direitos pessoais, ou essa é uma vasta região onde esses critérios não são aplicáveis e, por conseqüência, não está disposta a se comunicar com outras partes do mundo a não ser pela guerra e pela rejeição a populações que lhe parecem infiéis à mensagem divina?”.
Ele até contemporiza lembrando que os avanços da humanidade às vezes demoravam a ser absorvido por certos povos. Relembra que mesmo no meio da avalanche de idéias e sentimentos que atropelaram o ser humano no início do Iluminismo lugares como o Brasil ainda dependiam do trabalho escravo – até hoje os jornais, vez por outra, noticiam que a polícia desbaratou o trabalho escravo em uma fazenda onde um proprietário e seus capatazes não aprenderam nada sobre democracia e direitos humanos. Então, será que os árabes estão só um pouco atrasados e logo vão aprender a respeitar a crença dos outros e tentar todos os meios para resolver pendências políticas em paz? Ou a intolerância é uma parte irremovível da cultura árabe?
Touraine reconhece que boa parte do mundo árabe vem se esforçando para se adaptar a modernidade e aos conceitos de direitos individuais. Porém, ele vê entre eles um comportamento antigo e tribal: o direito comunitário, profundamente entranhado em seus corações e o meio que usaram para sobrevier como povo as conquistas dos ocidentais. Aí ele percebe um grande perigo. Enquanto alguns sociólogos entendem que a imigração de muçulmanos para os países da Europa e da América vá ocidentalizá-los e fazê-los adotar normas jurídicas e morais do Ocidente e com isso, servindo como exemplo para os que ficaram no Oriente, modernizar o Islã, Alain acha que eles acabarão servindo de cabeça-de-ponte em meio à população do país que os acolheu e conseguirão influenciar os jovens sem perspectivas e ansiosos para acreditar em alguma coisa tornando-os terroristas que só vão ver a violência como meio de mudar ou destruir a sociedade que tirou suas esperanças.
Assim, Touraine, teme: “Se os muçulmanos continuarem recusando a existência de princípios universais e rejeitando a idéia de modernidade cuja essência é reconhecer a presença de princípios universais nos indivíduos particulares, não existirá mais comunicação possível entre os atores cujas culturas são completamente diferentes”. Ele não aceita o argumento idiota de que um árabe não vai aceitar a modernidade porque ela foi desenvolvida no Ocidente: “A Matemática e a Astrologia foram desenvolvidas em certos países e em determinadas épocas (como o Egito e a Mesopotâmia antigos), o que não impediu de serem aceitos pelo mundo inteiro. Assim, deve-se insistir na existência de princípios que, elaborados em uma parte do mundo e em uma época precisa, devem ser reconhecidos como valores universais pelo conjunto dos países”. Mesmo tendo lutado para se verem livres da dominação árabe, os europeus – especialmente os da península Ibérica – são agradecidos até hoje pela cultura que os árabes adicionaram a seu modo de viver.
Dificilmente, no Brasil, havemos de enfrentar alguma luta entre evangélicos fanáticos e católicos ou espíritas, então é torcer para que esses nossos irmãos árabes aprendam a tolerância para não levar-nos todos de roldão em uma crise econômica ou militar: “Nenhuma sociedade tem o monopólio dos grandes princípios da modernidade, e o grau de acirramento dos conflitos fundamentais, sejam religiosos e culturais, ou simplesmente econômicos, obriga-nos a buscar negociações em níveis mais aprofundados e elevados”.
Coluna de Merval Pereira em O Globo, 14/04/2007

sexta-feira, 13 de abril de 2007


JEAN BAUDRILLARD 1929-2007 Sociólogo e filósofo francês que foi marcado por seus colegas como um niilista por uns e como o “pai do pensamento moderno” por outros, em mais de uma centena de livros foi um crítico feroz da cultura de consumo. Quando vamos ao shopping de uma metrópole, faiscante em centenas de lojas exibindo tudo o que a inventividade humana conseguiu produzir, às vezes nos pegamos pensando se aquilo é a vida real, a função maior do ser humano, ou é apenas um mundo virtual, como no filme Matrix que se inspirou no livro de Simulacros e Simulações, de Baudrillard.
O filósofo considerava a todos nós como cúmplices da situação em que vivemos, desta hiper-realidade que ele chama de “assassinato do real em que a clonagem de cultura e idéias pode configurar o fim de um dos traços fundamentais do homem: a morte”. Ele entendia que o espetáculo feérico mostrado pela mídia, igual a um carrossel enlouquecido, tira de nós a oportunidade de pensar e buscar mudanças para o mundo “neutralizando e anulado uns aos outros pelo excesso e pelo vazio de sentido”. Sua descrença completa, a negação veemente de valores aproveitáveis na sociedade humana, não era pregação de uma atitude de impotência, mas a celebração catastrófica de que precisamos mudar o rumo da humanidade. “O social funciona sobre a base da disfunção do acidente, do catastrófico e do irreal”.
Talvez por isso Baudrillard sentia um grande fascínio pelo mal, ainda que para entender sua força e melhor combatê-la. “Não se trata de ser contra a erradicação do mal. É preciso abandonar o idealismo”. Não acreditava nas visões de um mundo utópico nem na fé dos religiosos de que um dia a Terra será dos mansos e pacíficos: “Não existe este ponto ideal e perfeito, esse ponto de chegada para a história. Não há o bem sem o mal. Um está ao lado do outro. As coisas são reversíveis: são boas e se tornam más ou são más e se tornam boas”. Sua maneira arguta de ver o ser humano na história lhe dizia que existem forças naturais e sociais indomáveis: “Quero dizer que as coisas que são reprimidas não desaparecem, mas ressurgem adiante com maior força, tornando-se incontroláveis. Pensar a sociedade contemporânea consiste em pensar a produção do mal como uma energia incontrolável”. Assim, aquietemo-nos. Se houve um Nero que empalava os inocentes, um Átila que destroçava tudo que se interpunha às suas hordas, um Hitler que jogou milhões em fornos crematórios e um George W. Bush que acha mais importante que o imperialismo ianque continue faturando e o mundo que se exploda, ainda haverá muitos outros antiCristos.
Por tudo isto é que o mundo consegue inverter belos princípios e continuar matando milhões de humanos, irmãos da nossa espécie, de fome e doenças. Veja só: O ponto fraco do gigante norte-americano é seu desequilíbrio crônico das contas externas, sempre gasta muito mais do que fatura. E olha que vende horrores! No ano passado os EUA gastou quase 1 trilhão de dólares a mais do que produziu. Sabe quem financiou este estouro de caixa? Os países em desenvolvimento. A China conseguiu um superávit de 7% que aplicou em grande parte em papéis norte-americanos. E nós que já temos US$100 bilhões ‘malocados’ como reservas estratégicas! Gente, quanto esforço, suor e lágrimas, aplicados em bom papel impresso pelo Banco Central de GW Bush! Marx errou demais ao teorizar que o Capital devia fluir das economias desenvolvidas, dotadas de imensa capacidade de poupar e que já teriam explorado grande parte das suas oportunidades de investimento, para as economias em desenvolvimento. É, afinal, mais um fruto do nefasto mal que é inerente a raça humana.
O Globo, 10/03/2007, Opinião e Prosa&Verso

sexta-feira, 6 de abril de 2007

O Valor da Leitura e do Estudo




O que pode ter em comum o Dalai Lama com o ex-prefeito de Bogotá? Vou te contar. O líder espiritual dos tibetanos, Tensyn Gyatzo, vive no exílio e faz conferências em todos os países pedindo apoio para que a China reconheça a cultura, a religião e as tradições do povo que vive no alto do Himalaia. Mas ele fala de outra preocupação que o aflige: “Nosso desafio é preservar os valores morais, a espiritualidade entre os jovens. Venerar imagens não significa espiritualidade. É preciso ler mais, o importante é aprender sempre, ler cada vez mais os textos budistas”.
É lógico que como pastor religioso ele prega a devoção nos jovens, mas veja bem como ele insiste na leitura. Precisamos instar com nossos filhos, sem esmorecer, para que sentem pra ler. Estão no computador, diga alguma coisa positiva para pegarem um livro. Estão vendo TV, fale alguma coisa otimista sobre um livro. É claro que o pai e a mãe também precisam ler algum livro vez por outra. E a leitura tem um efeito secundário sobre o jovem: “Temos que fazer algo antes que seja tarde. Cada vez mais os jovens só se interessam por ganhar dinheiro. Muitos estão perdendo a espiritualidade”.
E o que pensa o Sr. Henrique Peñalosa, um ex-prefeito da capital da Colômbia? Quando três governadores brasileiros o visitaram falou sobre as ações que conseguiram baixar muito o crime naquela cidade de morros e favelas: “Nós decidimos não investir num plano de fazer oito auto-estradas na cidade, que custaria US$2,2 bilhões, e executar um projeto de ônibus articulado por que só 15% das pessoas têm carro. Decidimos investir em transporte público. Com a economia que fizemos pudemos construir escolas de qualidade, bibliotecas, parques, ciclovias e calçadões. Nós demos a cidade aos pobre, que não tinham como usá-la”. Ele contou que a polícia também se tornou mais comum nas ruas, mas o respeito à cidadania com a melhoria dos serviços públicos – com principal foco na leitura e numa educação eficiente – foi o fator de sucesso.
Do outro lado do mundo vem uma constatação do valor do investimento no ser humano. Na China o fator principal para o impetuoso crescimento econômico foi resumido em quatro pontos pelo economista Ilian Mihov: “Para criar um milagre, para crescer realmente rápido, é preciso investimento de pelo menos 25% do PIB. O crescimento não vem com a instalação de grandes fábricas e companhias multinacionais. O crescimento ocorre quando a população local se interessa pelo estudo, cria inovações, monta seus próprios negócios e gera empregos”.
Tenho 5 filhos, os netos vão para 6 e as noras e genros são 4. Todo este time precisa ser lembrado que a situação vai ficar cada vez mais difícil, tanto na situação ecológica quanto na econômica. O que vai “salvar”, selecionar, os melhores indivíduos será a instrução que acumularem, os conceitos éticos e humanísticos bem encravados em seus corações e uma espiritualidade que não é a mesma coisa que religiosidade. Então, nós, os mais velhos, precisamos continuar como um farol para os mais jovens dando exemplo, conselhos e incentivo positivo que não pode cessar nunca.
O Globo, 18/03/2007